‘Gabinete do Amor’: o esquadrão para defender Lula e atacar opositores
A rede de ativismo emprega as mesmas táticas anteriormente atribuídas ao "Gabinete do Ódio" bolsonarista, mas opera sem as mesmas consequências.
Reportagem publicada em 2 de março de 2024
A vitória de Donald Trump em 2016 marcou um ponto de inflexão na política contemporânea. As alegações de interferência russa a seu favor — hoje amplamente refutadas — ressurgiram no Brasil. No caso de Bolsonaro, o foco foi o suposto envio em massa de notícias falsas via WhatsApp.
Desde o início da administração Bolsonaro, em 2019, surgiram várias acusações de que pessoas ligadas ao presidente, incluindo seu filho, o vereador Carlos Bolsonaro, comporiam uma espécie de “Milícia Digital”, que teria o objetivo de atacar opositores e defender o governo. Tais acusações, oriundas de ex-aliados como os então deputados Joice Hasselmann e Alexandre Frota, foram incorporadas à CPMI das Fake News e ao Inquérito das Fake News.
Mesmo agora, mais de um ano após a saída de Bolsonaro da presidência, a narrativa continua a embasar as investigações do Inquérito das Fake News, presidido pelo ministro Alexandre de Moraes do Supremo Tribunal Federal (STF). Esta investigação está em vias de completar o seu 5º aniversário. Entretanto, há hoje uma rede de formato semelhante à imputada ao GDO, mas com um alcance muito mais amplo e com práticas ainda mais deploráveis: o chamado Gabinete do Amor. A diferença é que neste caso há uma total complacência dos que atuaram contra o GDO. E não apenas isso, há participação destes atores.
O Gabinete do Amor se caracteriza pela sua composição exclusivamente esquerdista, visando proteger o governo de Luís Inácio Lula da Silva (PT) e atacar adversários. Diferente da militância de direita, seus membros são altamente organizados e contam com o apoio de entidades governamentais e grandes corporações. A rede é composta por: influenciadores, perfis “apócrifos”, perfis falsos, políticos e empresários. Entre as práticas estão ataques em massa nas redes sociais, uso de tags (frases em forma de chavão compartilhadas em massa nas redes sociais. Geralmente feitas em caixa alta), hashtags, assassinato de reputação, disseminação de mentiras e ataques para derrubadas de contas opositoras.
Nossa reportagem entrou em contato com os envolvidos, mas até o momento desta publicação não obtivemos resposta. O espaço seguirá aberto.
O início
A formação do GDA remonta à eleição de Bolsonaro, em 2018, marcada pela mobilização inicial de perfis anônimos e ativistas digitais, que se intensificou ao longo de seu mandato, ampliando sua atuação até as eleições de 2022 e continuando no presente para apoiar Lula e atacar seus adversários.
Em 2018, como forma de criar uma resistência ao novo governo, foram criados os perfis “Jair me Arrependi” (“Jairme”), “Bolsominions Arrependidos” e “Museu Da Direita Histérica”. Inspirados pela movimentação de militantes americanos que criaram perfis anônimos para se opor a Donald Trump, esses grupos buscaram na estratégia digital um meio de oposição ao governo Bolsonaro.
Em entrevista ao Portal UOL, em novembro de 2022, o perfil Jairme foi exaltado por ter “modernizado a esquerda” com suas táticas digitais. Criado para zombar de eleitores de Bolsonaro que, supostamente, se arrependeram de seu voto, o perfil, que hoje tem mais de 400 mil seguidores no X, passou a fazer militância pró Lula. Em agradecimento por esta atuação, em 13 de setembro de 2023, Lula e o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, desejaram feliz aniversário a Jairme nas redes sociais.
A CPI da Pandemia
Ao longo da gestão Bolsonaro, estes perfis se tornaram uma poderosa arma de contrainformação da esquerda. Mas foi durante a pandemia de Covid-19 que eles tomaram força, quando estes grupos passaram a dar suporte à oposição na CPI da Pandemia, e atuaram através de uma estratégia orquestrada de influência e pressão sobre os trabalhos da comissão.
Uma das figuras não anônimas que se destacam neste contexto foi a influenciadora Leila Germano. Conhecida por ter participado do canal Jovem Nerd, posteriormente fundando os podcasts “Hoje Tem” e “República de Bolchevique”, Leila conduziu diversas entrevistas dentro da CPI para disseminar a narrativa dos senadores.
Entretanto, são os perfis anônimos que formaram a espinha dorsal da estratégia digital do GDA. Utilizando uma ampla rede de perfis anônimos e coordenados, o GDA forneceu um suporte digital aos parlamentares de oposição ao governo Bolsonaro, funcionando como uma espécie de "central de inteligência" virtual. Eles se dedicaram a compilar dados e criar dossiês, e até mesmo orientar o direcionamento das investigações e questionamentos feitos aos depoentes.
O perfil Jairme chegou a ser mostrado ao vivo na CPI da Covid para “desmascarar” o ex-secretário de Comunicação Fabio Wajngarten. Os demais perfis também participaram da CPI, enviando relatórios e dossiês para Renan Calheiros (MDB-AL) e Randolfe Rodrigues (Rede-AP), atualmente sem partido, e demais parlamentares que conduziam as investigações.
Raldolfe, inclusive, destacou em uma transmissão nas redes sociais “a grande contribuição” de dois ou três perfis anônimos para a CPI. Se gabando desta menção, o perfil Tesoureiros elencou os outros perfis que teriam sido citados por Randolfe: @jairmearrependi, @bolsoregrets, @camarotecpi e @desmentindobozo. Este último foi citado por Alexandre de Moraes como referência para arquivar a denúncia da campanha de Jair Bolsonaro sobre a discrepância nas inserções das rádios durante as eleições, o chamado “Radiolão”.
O que todos estes perfis têm em comum? Todos são anônimos, ou apócrifos. Em 2022 o TSE chegou a ordenar que o X (anteriormente Twitter) identificasse a pessoa responsável pelo perfil “Jair Me Arrependi” em resposta a uma representação feita pela campanha de Ciro Gomes, que acusava o perfil de propaganda política irregular, capaz de enganar os eleitores. Jairme havia criado um filtro para o Twitter que, usando as mesmas cores e identidade visual da campanha de Ciro, trazia escrito “prefiro Lula”. O advogado Rafael Mafei dedicou um artigo no site jurídico Jota para defender o anonimato de Jairme, alegando que é um “perfil de humor e crítica política”. Mesmo com a ação, o anonimato de Jairme ainda não foi derrubado.
E fica a questão: por que a mesma defesa não foi feita a diversos outros perfis acusados de participarem do aludido “Gabinete do Ódio”?
O Perfil Sleeping Giants Brasil (SGBR ) foi criado em 18 de maio de 2020 e rapidamente ganhou destaque, especialmente no Twitter, onde rapidamente conquistou um grande número de seguidores. Seu sucesso inicial foi significativamente impulsionado pelo apoio de famosos como Luciano Huck e Felipe Neto. A estratégia do SGBR envolve atacar meios de comunicação de direita, pressionando os anunciantes a retirarem os seus patrocínios. Embora se apresente como um “movimento de consumidores apartidário”, o SGBR mira apenas personalidades de direita.
Há hoje diversos processos em tribunais para descobrir as identidades reais dos operadores de SGBR, que frequentemente ocultam seus endereços IP com o uso de VPNs. Após uma decisão judicial exigir a divulgação da identidade do grupo por atacar um jornal conservador em dezembro de 2020, os universitários Leonardo de Carvalho Leal e Mayara Stelle, ambos com 22 anos na época, assumiram a responsabilidade pelas operações do SGBR, encerrando sete meses de anonimato. Mas, para muitos, ambos não passam de laranjas e os reais responsáveis continuam ocultos.
Embora as atividades do SGBR se limitem a publicações em redes sociais, o grupo recebeu pouco mais de R$ 2,4 milhões da Ford Foundation e da Open Society Foundation (OSF) em 2022 e 2023. Em 2022, Sleeping Giants recebeu cerca de 200 mil reais do Instituto Serrapilheira para a realização de um estudo sobre fraudes científicas na pesquisa de vacinação contra a Covid-19. Não há qualquer informação sobre a publicação deste estudo.
Em agosto de 2023, a cofundadora do Sleeping Giants, Mayara Stelle, participou do Seminário "Combate à Desinformação e Defesa da Democracia" realizado pelo STF, ao lado do ministro Alexandre de Moraes. Durante a campanha eleitoral de 2022, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), presidido por Moraes, acatou recomendações feitas pelo SGBR.
O "QG" lulista
Durante as eleições de 2022 o Gabinete do Amor foi reforçado com a entrada de agências de marketing. Um dos primeiros passos tomados pela campanha de Lula, sob a coordenação do advogado Cristiano Zanin, foi a criação de uma sala de monitoramento de redes sociais, que funcionava como um Quartel General (QG). Analistas monitoravam as redes sociais para identificar “fake news” visando ações judiciais imediatas para sua remoção ou desmonetização.
Esta iniciativa surgiu em resposta à preocupação de que as táticas digitais empregadas por Jair Bolsonaro pudessem replicar a influência significativa que tiveram durante o pleito eleitoral de 2018. Para garantir o sucesso da campanha de Lula, foi contratado Marcos Carvalho, especialista em marketing digital e presidente da agência AM4, realizadora da bem-sucedida campanha digital de Bolsonaro, em 2018. Marcos, que rompeu com Jair após desentendimentos com seu filho, Carlos, entrou para a campanha de Lula por influência de Zanin, segundo a Revista Piauí.
A fim de renovar a imagem de Lula entre os jovens, a sua campanha contou com uma importante colaboradora: Brunna Rosa, estrategista digital da campanha de Lula conhecida como a “Companheira do Tik Tok”, incorporou na comunicação influenciadores e ex-BBBs para ampliar o alcance do candidato nas redes sociais. Explorando a popularidade dessas figuras para gerar engajamento e simpatia ao redor de Lula.
Rosa também foi responsável por aproximar Lula dos influenciadores digitais membros do "squad" da Mynd8, agência de marketing de influência especializada na gestão de carreiras de influenciadores digitais, artistas e personalidades, que se tornou notória após a morte de Jéssica Canedo, jovem que se suicidou após mentiras serem publicadas por perfis de fofoca ligados à Mynd. Especificamente, uma conversa íntima falsamente atribuída a ela e ao humorista Whindersson Nunes foi divulgada pelo perfil "Garotx do Blog" e posteriormente amplificada pelo "Choquei", um perfil com mais de 20 milhões de seguidores no Instagram, 6,7 milhões no Twitter e 2,5 milhões no TikTok, conhecido por divulgar conteúdos de fofoca sem apuração. A Choquei fez campanha política aberta para Lula e segundo a reportagem da Revista Piauí, Janja era fonte de Raphael Sousa, fundador da Choquei. Dada a proximidade, Janja o convidou para subir no carro de som oficial na avenida Paulista para acompanhar o discurso da vitória de Lula. Pouco tempo depois de ficar “fora do ar” após a repercussão negativa do caso, a Choquei voltou a publicar para divulgar o BB24 da Rede Globo.
Entre dezembro de 2021 e março de 2022, o Instituto Lula, com a participação da Mynd8, organizou um treinamento para lideranças digitais visando as eleições de 2022, destacando-se a presença de Bela Gil e Brunna Rosa. Durante as eleições, alguns destes blogs e perfis de fofoca participaram de uma campanha de difamação contra Jair Bolsonaro para associá-lo ao satanismo. Segundo reportagem do jornal Gazeta do Povo, o objetivo era atrair o voto evangélico para Lula. Entre as estratégias estava, inclusive, a utilização de inteligência artificial para a criação de perfis falsos para a difamação. Um destes perfis figurou em diversos sites de notícias fingindo ser uma bolsonarista arrependida. Segundo o grupo de militantes Boca de Lobo, que participou desta campanha de difamação, a ordem para a disseminação desta narrativa veio direto do deputado André Janones (Avante-MG), que atuou na campanha de Lula. Mentiroso confesso, Janones se gaba de sua “técnica de guerrilha” que utiliza a desinformação para destruir a imagem dos adversários.
Um dos primeiros veículos a publicar sobre a associação de Bolsonaro com a maçonaria foi o PopTime, portal dedicado ao mundo dos “artistas pop”, mas que repentinamente, nos últimos meses, passou a militar em favor de Lula. No dia anterior à votação do primeiro turno, a página PopTime fez uma publicação no Facebook conclamando trazer votos para Lula: “Datafolha e Ipec afirmam que Lula ganhará as eleições no primeiro turno e se tornará amanhã o novo Presidente da República! É hora de virar seu voto, não podemos deixar Bolsonaro passar mais um mês fazendo campanha suja”. Publicações idênticas também viralizaram nos blogs PopOnze, Choquei, que na época era verificado pelo Twitter, e QG do POP, todos com temática semelhante. Houve também disseminação da mentira pelo Fórum Pandlr, comunidade dedicada ao público LGBT.
Embora os influenciadores afirmem que atuaram em prol de Lula de forma “voluntária”, há suspeitas de que não agiram de graça. O site Caneta Desesquerdizadora publicou em janeiro deste ano um artigo levantando questionamentos sobre o financiamento das atividades dos influenciadores da Mynd, apontando que estes poderiam ter atuado sem remuneração na campanha de Lula. O texto destaca os altos gastos com a empresa de Brunna Rosa para gestão de redes sociais, sugerindo que esses valores poderiam, de fato, ter sido repassados à Mynd.
A Embaúba Produções Ltda., recebeu um total de R$ 3,1 milhões pelos serviços prestados. Desse montante, R$ 2,2 milhões foram alocados para as atividades do primeiro turno das eleições, enquanto os restantes R$ 900 mil foram destinados ao segundo turno, conforme detalhamento das despesas eleitorais. Importante destacar que a empresa não possui site e hoje tem um outro quadro societário do qual Rosa não faz parte.
Pós eleições
Após a posse de Lula em 2023, as atividades do gabinete não pararam e se concentraram na blindagem do presidente recém-eleito e nos ataques a opositores. Como agradecimento pela sua atuação nas eleições, Lula reuniu-se com um grupo de 50 influenciadores digitais no Palácio do Planalto com o objetivo de discutir “estratégias de combate à desinformação”. O grupo "Influenciadores pela Democracia", assim denominados pelo governo, tinha como participantes diversos integrantes do GDA, incluindo perfis e blogs da “Banca Digital” da agência Mynd.
Durante encontro, organizado pela primeira-dama, Janja, Lula destacou que a vitória nas eleições não teria sido possível sem o "trabalho voluntário de influenciadores nas redes". Lula também destacou que esta era a primeira de muitas outras atividades semelhantes. "Nesses quatro anos, temos uma tarefa importante: resgatar um pouco de solidariedade e amor em uma parcela da sociedade que perdeu isso nos últimos anos", disse Lula. Entretanto, o que registramos desde então foram uma série de ataques a pessoas que discordem ou critiquem o governo.
No final de junho de 2023, o Sindicato dos Petroleiros do Espírito Santo reuniu diversos influenciadores e especialistas em comunicação do espectro político da esquerda, visando o intercâmbio de experiências. Muitos dos participantes desse encontro, que tinha como bandeira o fortalecimento de estratégias conjuntas de atuação nas redes sociais, também marcaram presença no evento dos "Influenciadores pela Democracia" com o presidente Lula.
Entre os participantes do evento do Sindipetro-ES e Influenciadores pela Democracia estava Rodrigo Kenji, publicitário e influenciador digital conhecido pelo pseudônimo Normose que em dezembro de 2023 iniciou uma mobilização digital para confrontar a "desinformação" propagada pela produtora Brasil Paralelo. Normose convocou seus seguidores e outros criadores de conteúdo visando a produção e o compartilhamento massivo de conteúdo negativo à Brasil Paralelo.
Diversos nomes do Gabinete do Amor estão entre os convocados: o Sindipetro-ES e seu diretor Rodrigo Ferri, Gustavo Nassar Gaiofato, Sérgio Hof, Cris Vector, Luide, Dimitra Vulcana, Laura Sabino, Iconografia da História, Orlando Calheiros e Arte Villar, além dos perfis @fiscaldoibama, @brparalerdo, @assimdisseojoao e @startupdareal. Foram chamados também os já citados @tesoureiros, @jairmearrependi, @ady_news e @abocadelobo. A mobilização também inspirou a participação voluntária de outros influenciadores, como Ale Santos, Luka Franca, Lazaro Rosa, Letícia Sarturi e Levi Kaique Ferreira.
Destacamos alguns comentários sobre a iniciativa: "já pensou vocês soltam 10~15 vídeos tudo junto na mesma semana, com as mesma tag, um monte de gente diferente denunciando a mesma coisa, o bug que ia dar no robôzinho do YouTube. Seria lindo", escreveu um tuiteiro. "Posso tentar colocar essa ideia no ICL", escreveu André Campedelli, que em sua bio no X se diz ser Economista do Instituto Conhecimento Liberta (ICL), um dos mais agressivos think tanks de esquerda no Brasil. Fundado pelo ex-banqueiro Eduardo Moreira, o ICL tem cooptado diversos jornalistas como Leandro Demori (EBC), Juliana Dal Piva (UOL) e Guilherme Amado (Metrópoles).
Recentemente, diversos militantes de esquerda do GDA anunciaram a criação de um núcleo para “combater os extremistas bolsonaristas nas redes sociais” e “recrutar soldados para a guerra contra a extrema-direita nas redes”. Denominado “Militância Raiz”, o site do projeto está registrado em nome de Lázaro Rosa, militante tuiteiro que participou do “Influência, Brasil!”, evento realizado pelo Sebrae em agosto de 2023 e que contou com a presença da primeira-dama Rosângela Lula da Silva, a Janja.
A iniciativa conta com a participação e apoio dos demais integrantes da militância tuiteira de esquerda: Vinicios Betiol, Thiago dos Reis, Pedro Ronchi e Henrique Lopes. Participam também o sobrinho-neto da ex-presidente Dilma Rousseff, Pedro Rousseff, e a tiktoker Ive Brussel.
Estas manobras, especialmente à sombra das preparações para as eleições municipais de 2024, não apenas sublinham uma utilização calculada das redes sociais para influenciar a opinião pública e a mobilização eleitoral, mas também expõem uma prática de duplo padrão preocupante. Enquanto a esquerda condenou vigorosamente as supostas ações do 'Gabinete do Ódio' durante a administração Bolsonaro, a emergência e a operacionalização do 'Gabinete do Amor' revelam uma disposição similar de empregar táticas digitais questionáveis em nome da política.
A complacência, e em certos casos, a participação ativa de figuras anteriormente críticas a essas estratégias, levanta questões significativas sobre a integridade e a transparência da luta política nas redes. Em um momento em que a verdade e a ética são cada vez mais necessárias para salvaguardar o tecido democrático, o silêncio conveniente e a justificação de tais práticas em 'nome do amor' apenas servem para aprofundar as divisões e minar a confiança nas instituições.
As principais táticas
Ainda que algumas das táticas utilizadas pelo GDA sejam as mesmas das atribuídas ao Gabinete do Ódio bolsonarista, até hoje nenhum dos seus integrantes foram incluídos nos inquéritos que tramitam no STF para a investigação deste tema.
Os diversos grupos do GDA atuam de forma complementar, ainda que não tenham ligação direta. As principais táticas utilizadas pelo GDA identificadas pela nossa equipe são:
Disseminação de narrativas: Espalhamento de teses para defender o governo;
Compartilhamento de mentiras (Fakenews): Narrativas compartilhadas que são reconhecidamente falsas;
Levantamento de Tags: Criação ou compartilhamento de tags para figurar nos trending topics e simular uma manifestação orgânica;
Ataque em massa (cancelamento): Ataques coordenados contra pessoas ou instituições específicas. Incluindo campanhas de difamação e ameaças;
Derrubada perfis: Denúncias em massa feitas às plataformas com o objetivo de retirar perfis do ar;
Doxxing: prática de pesquisar e de transmitir dados privados sobre um indivíduo ou organização. O objetivo do doxxing é humilhar, intimidar, assediar ou prejudicar a vítima de alguma forma;
Campanha de boicote: Ações coordenadas para que empresas deixem de patrocinar veículos ou organizações.
Uso de bots: Utilização de robôs para massificar ataques coordenados contra pessoas ou instituições.
Os principais ataques em “nome do amor”
Entre inúmeros ataques e ações de contrainformação realizados por integrantes do GDA, listamos os que se destacam por suas características peculiares:
1. Ataques de robôs a jornalistas
Em meio à catástrofe do ciclone extratropical que devastou o Sul do Brasil, em setembro de 2023, surgiram acusações sobre a abertura de comportas de hidrelétricas no Rio Grande do Sul e a gestão centralizada das doações pelo governo federal. Essas questões desencadearam ataques contra jornalistas e figuras que solicitavam investigações, utilizando-se de estratégias como o uso de robôs, MAVs (Militância em Ambiente Virtual) e ações do chamado ‘Ministério da Verdade’ contra críticos.
O canal Visão Pátria realizou uma análise detalhada sobre os ataques direcionados a Steh Papaiano, identificando um padrão sistemático de assédio e denuncismo em massa orquestrado por perfis automatizados no Twitter. A investigação revelou um padrão nos comentários, inicialmente percebidos como uma multidão de perfis com fotos aleatórias de anime, todos utilizando o mesmo texto e um método automatizado semelhante para a criação de nomes de usuário e apelidos.
Os tweets de ataque, repetindo frases como "STEH PAPAIANO NA CADEIA" e listando outros nomes a serem "encarcerados", foram seguidos por perfis envolvidos em constante assédio e denuncismo coletivo. Visão Pátria apontou ainda para uma "rotina de testes" com padrões de postagem que a esquerda tem massificado, incluindo o uso de palavras ou frases em caixa alta para tentar atingir os trending topics.
Alguns perfis, segundo a análise, foram criados sequencialmente e publicavam os mesmos memes e textos em uma ordem cronológica. O retorno do administrador das contas para um segundo ataque contra Papaiano, utilizando-se de mais de 100 contas com erros repetidos de grafia, forneceu ao Visão Pátria certeza da origem única dos disparos.
Envolvidos
Alexandre Garcia: Jornalista que pediu investigações sobre a gestão da crise. Tornou-se alvo da Procuradoria Nacional de Defesa da Democracia (PNDD) após criticar a gestão do governo na enchente;
Stefanny Papaiano: Advogada e comentarista política que divulgou esclarecimentos sobre o caso das doações. Foi alvo de ataques coordenados por MAVs e robôs. No dia seguinte, Papaiano abriu um Boletim de ocorrência contra os agressores virtuais;
Jorge Messias (Bessias): Advogado-Geral da União, conhecido por seu papel nas interceptações telefônicas entre Dilma e Lula. Usou sua posição para atacar Alexandre Garcia por disseminação de informações falsas;
Flávio Dino: Então Ministro da Justiça . Em publicação no X afirmou acionou a PF contra as “fake news” disseminadas. Dino também afirmou que "fake news é crime e não instrumento de luta política". A publicação foi sinalizada pelas Notas da Comunidade do Twitter pois disseminar fake news não é crime no Brasil, ao contrário do que afirmou o ministro;
Leandro Demori: Jornalista, cuja publicação incitou ataques contra Stefanny Papaiano.
Táticas Utilizadas
Robôs (Bots): Utilizados em ataques coordenados para amplificar mensagens e ataques contra indivíduos específicos, mostrando comportamento automatizado e mensagens idênticas. A estratégia foi inicialmente identificada pelo canal Visão Pátria;
MAVs (Militância em Ambiente Virtual): Militantes digitais que participam de campanhas coordenadas para atacar opositores e disseminar narrativas favoráveis ao governo;
“Ministério da Verdade” (PNDD): Estrutura criada pelo governo Lula para enfrentar a desinformação, mas criticada por ser usada como ferramenta de perseguição a opositores, lembrando a distopia de "1984" de George Orwell, onde o Estado determina o que é verdadeiro ou falso.
2. Ataques a jornalistas do Estadão
Leandro Demori, ex-diretor do The Intercept e recentemente contratado pela Empresa Brasil de Comunicação (EBC) com um salário anual de 440 mil reais, é um dos principais articuladores de ataques virtuais em defesa do governo Lula. Um destes ataques foi direcionado contra jornalistas do Estadão, que divulgaram a presença de uma figura ligada ao tráfico de drogas no Planalto.
Envolvidos
Leandro Demori: Ex-diretor do The Intercept e recentemente contratado pela EBC. Acusado de usar sua posição para defender o governo Lula e atacar opositores, incluindo jornalistas e figuras públicas. Seu contrato com a EBC é notável pelo alto valor e pela dispensa de licitação, sob a justificativa de sua singularidade e qualificações;
Jornalistas do Estadão (André Shalders e Tássio Lorran): Alvos de ataques coordenados por apoiadores do governo após divulgarem informações sobre a presença de Luciane Barbosa Farias, ligada ao Comando Vermelho, em reuniões no Ministério da Justiça;
Andreza Matais: Então diretora-executiva do Estadão, foi o principal alvo dos ataques após a reportagem sobre a “Dama do Tráfico”. Então diretora-executiva do Estadão, foi o principal alvo dos ataques após a reportagem sobre a “Dama do Tráfico”. Em um evento anterior Andreza teve os dados de sua conta no portal “Gov.br” invadida por hackers que trocaram a senha de acesso da jornalista e exigiram dinheiro para não divulgarem informações de seu Imposto de Renda. O ataque ocorreu após o Estadão publicar reportagem que revelou que Lula atuou para liberar empréstimo e interferir na eleição da Argentina;
Felipe Neto: youtuber que publicou uma foto de Andreza Matais com a legenda "Quem financia a dama das fake news?". Posteriormente Neto apagou a publicação e fez um pedido de retratação. Embora este não seja o primeiro ataque realizado pelo youtuber, ele é um dos integrantes do grupo de trabalho instaurado pelo ministério dos Direitos Humanos Silvio de Almeida para combater o “discurso de ódio” no Brasil. O youtuber foi nomeado para o grupo de trabalho pelo próprio presidente Lula;
Thiago dos Reis: criador do blogue Plantão Brasil, que conta com mais de 1 milhão de seguidores no Facebook e é destinado a atacar Bolsonaro e defender Lula — nesta ordem. Reis foi um dos maiores impulsionadores da tag “Dama das Fakenews”, fazendo-a figurar nos trending topics. O blogueiro também publicou Twitter a foto de Andreza Matais e instou que a Polícia Federal fosse acionada para ”apurar quem financia as fake news do Estadão”. Reis enfrenta na Justiça acusações de crimes contra a honra do senador Flávio Bolsonaro, que pode lhe render uma pena de quatro anos de prisão, e também já foi alvo de mandado de prisão acusado pelo próprio pai de deixar o idoso em estado de vulnerabilidade social e insegurança alimentar;
Renato Rovai: diretor de redação da Revista Fórum, — blog pró-PT que recebia vultuosos recursos públicos durante o governo Dilma e recentemente voltou a receber recursos do governo federal —, publicou uma “reportagem” afirmando que uma “denúncia” foi realizada por jornalistas do Estadão ao Ministério Público do Trabalho denunciando que Andreza Matais diretora executiva de política do Estadão teria pressionado os jornalistas a publicar mentiras sobre o governo.
Táticas Utilizadas
Ataques Coordenados: Utilização de plataformas digitais e redes sociais para organizar e executar ataques contra jornalistas e opositores políticos, visando descredibilizar críticas e informações adversas ao governo;
Criação e promoção de TAGs: Palavras-chave disseminadas pelos militantes para emplacar a narrativa nos trending topics;
Criação de Narrativas: Emprego de programas de mídia e influenciadores para disseminar narrativas favoráveis ao governo, minimizando controvérsias e amplificando críticas a adversários.
3. Ataques antissemitas
André Lajst, cientista político judeu e representante da organização Stand With Us Brasil, tornou-se alvo de ataques coordenados nas redes sociais, liderados por Leandro Demori. Após Lajst refutar afirmações do presidente Lula sobre a guerra entre Israel e Palestina, Demori questionou publicamente a formação acadêmica de Lajst e a fonte de financiamento da Stand With Us Brasil, incitando uma campanha de ataques que impactaram negativamente a presença digital de Lajst.
Envolvidos
André Lajst: Cientista político e representante da Stand With Us Brasil, vítima de ataques digitais após criticar declarações do presidente Lula sobre o conflito Israel-Palestina;
Leandro Demori: Jornalista, ex-diretor do The Intercept e atualmente na EBC. Iniciou os ataques contra Lajst questionando sua credibilidade e financiamento;
Breno Altman: Fundador do site Opera Mundi e crítico de Israel, envolvido na defesa das posições de Demori e ataques a Lajst;
Hélio Doyle: Jornalista que assinou o contrato de Demori com a EBC e participou dos ataques, posteriormente demitido por comentários antissemitas.
Táticas Utilizadas
Desqualificação Pública: Demori utilizou suas plataformas para questionar a integridade acadêmica e o financiamento de Lajst, insinuando falta de transparência e possíveis segundas intenções em suas críticas ao governo;
Campanha de Ataques em Massa: Seguidores de Demori e outros MAVs (Militância em Ambientes Virtuais) responderam ao seu chamado, atacando Lajst nas redes sociais, o que resultou em uma redução significativa do alcance de suas publicações, possivelmente indicando um shadowban;
Estigmatização por Associação: A tentativa de ligar Lajst a posições políticas ou sociais controversas, simplesmente por criticar o governo ou por ser judeu, visando desacreditá-lo perante a opinião pública;
Censura Digital: As publicações de Lajst foram marcadas como "conteúdo potencialmente sensível" nas redes sociais, um indicativo de que sofreu ataques coordenados visando limitar sua expressão e alcance.
4. Ministra negra no STF
Com a aposentadoria da ministra Rosa Weber do STF em outubro de 2023, surgiu a campanha "Toma um Café com Elas, Lula!" para que o presidente nomeasse uma ministra negra para preencher a vaga. Uma das principais vozes desta campanha foi o humorista Gregório Duvivier, apresentador do programa “Greg News” e um dos criadores do canal “Porta dos Fundos”. A campanha desagradou à militância petista, que lançou ataques coordenados, não apenas contra Duvivier, mas também contra outros esquerdistas que questionaram ou apresentaram opiniões divergentes das linhas defendidas pelo governo Lula.
Duvivier foi chamado de “maconheiro do Leblon”, “agente da CIA”, e acusado de promover uma “revolução colorida” com financiamento de George Soros. Também enfrentou alegações de manter uma empresa racista, o Porta dos Fundos, e fazer humor racista. Duvivier também foi acusado de ter apoiado o impeachment de Dilma Rousseff, apesar de seu histórico de apoio ao Partido dos Trabalhadores (PT) e à esquerda.
Os ataques também foram desferidos contra o ex-deputado e ex-autoexilado Jean Wyllys, hoje filiado ao PT, após críticas a Lula. “Descobri algo tão ruim quanto o antipetismo da direita e da extrema-direita na mídia neoliberal e no X (ex-Twitter): o hater-gado-petista que não aceita qualquer crítica ou revelação de fato ruim em relação a membros do governo Lula ou ao próprio Lula”, escreveu Wyllys no X, e acrescentou “Qual será o próximo passo? Ameaçar de morte? Olhou muito tempo para o abismo e este o olhou de volta! Cruzes!”.
Segundo o Boletim da Liberdade, posteriormente Wyllys afirmou em um podcast que foi alvo de “sabotagem” do ministro da Comunicação Social, Paulo Pimenta.
Envolvidos
Gregório Duvivier: Promoveu a campanha pela nomeação de uma ministra negra ao STF, o que desencadeou uma série de ataques por parte de petistas;
Jean Wyllys: ex-deputado, atacado pela militância petista por críticas a Lula;
Renê Silva: Militante do movimento negro, fundador da ONG Voz das Comunidades, também recebeu ataques por críticas a possível escolha de Lula para o STF;
Paulo Pimenta: Chefe da Secretaria de Comunicação Social (SECOM) do governo Lula. Apontado como o possível coordenador dos ataques do GDA.
Táticas Utilizadas
Ataques Pessoais e Difamação: Utilização de acusações sem fundamento, ataques ad hominem e difamação para desacreditar Duvivier e minimizar o impacto de sua campanha;
Recontextualização de Postagens Antigas: Seleção e compartilhamento de postagens antigas de Duvivier em um novo contexto, visando questionar sua coerência e comprometimento com as causas que defende;
Criação de Narrativas Falsas: Propagação de informações falsas ou distorcidas sobre Duvivier, como acusações de apoiar o impeachment de Dilma Rousseff e de ter interesses contrários aos do PT;
Mobilização nas Redes Sociais: Coordenação de esforços entre usuários do X e outras plataformas sociais para amplificar as críticas a Duvivier, utilizando hashtags e marcadores específicos para reunir os ataques em uma frente comum.
5. Jair Maçonaro
Após o início do segundo turno das eleições presidenciais de 2022, uma campanha orquestrada por apoiadores do Partido dos Trabalhadores (PT) lançou uma série de fake news sob a bandeira "Jair Maçonaro Satanista". O objetivo era associar Jair Bolsonaro ao satanismo e à maçonaria para desviar votos evangélicos em favor de Luiz Inácio Lula da Silva. A estratégia incluiu a criação de perfis falsos com uso de inteligência artificial, visando simular uma deserção em massa do eleitorado evangélico de Bolsonaro.
Envolvidos
Jair Bolsonaro: Acusado falsamente de ter ligações com a maçonaria e o satanismo, visando prejudicar sua imagem junto ao eleitorado evangélico;
André Janones: Deputado federal eleito por MG, participou ativamente na disseminação das fake news, associando Bolsonaro à maçonaria e ao satanismo;
José Luiz Santos Guimarães (Hey Lugui): Designer e jornalista, responsável pelo PopTime, celebrou o aumento significativo de tráfego em suas redes sociais após as publicações;
Portais PopTime, Pop Onze e Choquei: Veículos que divulgaram as acusações falsas, ambos passando a militar a favor de Lula nos meses anteriores à eleição;
Canal Boca de Lobo: Movimento de ativistas no Telegram de contra-narrativas, envolvidos na disseminação das acusações falsas a mando de Janones.
Pandlr: Fórum LGBT. Um dos centros de planejamento e execução da campanha, incluindo a criação e disseminação de conteúdo falso.
Táticas Utilizadas
Criação de Perfis Falsos: Uso de inteligência artificial para gerar imagens de perfis fictícios, promovendo a ideia de bolsonaristas arrependidos;
Disseminação de Narrativas Falsas: Espalhamento massivo de conteúdo que associa Bolsonaro a práticas e simbologias satanistas e maçônicas;
Viralização Estratégica: Coordenação entre blogs, canais de Telegram e influenciadores para amplificar o alcance das fake news;
Manipulação de Imagens: Edição de fotos para inserir simbologias relacionadas ao satanismo e à maçonaria em imagens de Bolsonaro;
Mobilização de Redes de Influência: Incentivo ao compartilhamento das fake news por parte de usuários comuns, influenciadores e até jornalistas.